domingo, 11 de abril de 2010

J. S. Bach (1685 - 1750)



UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS
Disciplina: Literatura e Repertório do Piano

JOHANN SEBASTIAN BACH

CRONOLOGIA
1685 – Nasce em Eisenach, filho e neto de organistas e cantores.
Adquiriu grande cultura clássica apreendendo grego e latim. Estudou composição com Helder e Böhm e foi reconhecido também como reparador de órgãos.
1714 – Músico e organista da corte de Weimar, nomeado konzertmeister; produz suas primeiras grandes obras para órgão e cravo.
1717 – Transferido para Cöthen, é nomeado kapellmeister.
Nessa época sua produção de música instrumental foi mais intensa, quando o órgão e a música de igreja não tiveram o mesmo tratamento. Entre as obras compostas nesse período pode-se citar as Suítes Francesas, Suítes Inglesas, as seis Sonatas para violino e cravo, os seis Concertos de Brandenburgo, Sonatas e Partitas para violino solo e as seis Suítes para violino solo.
1723 – Kantor da Igreja São Thomas de Leipzig; tinha a tarefa de compor uma nova cantata para cada domingo, festa ou cerimônia oficial, quando desenvolveu ainda mais sua arte composicional.
1750 – Morre em Leipzig.

A OBRA PARA TECLADO
O CRAVO BEM TEMPERADO (1722-1744)
BWV 846-869 e BWV 870-893
Obra composta em dois volumes contendo cada um 24 prelúdios e fugas. Escrita em todos os tons e semitons da escala, explora todas as possibilidades do temperamento, caracterizado pela divisão da escala em doze semitons iguais entre si. Sistema já pesquisado por outros, mas realizado satisfatoriamente por Bach, contribuindo assim para um grande desenvolvimento da música instrumental.
O Cravo bem Temperado, juntamente com as Variações Goldberg, pode ser considerado o ponto alto das composições para teclado de Bach. Tal a sua importância, foi utilizado como base para estudos diários de diversos compositores, entre eles Schumann e Chopin.
O primeiro volume foi concluído em 1722, em Cöthen, e o segundo escrito entre 1740 e 1744, em Leipzig.

Observações:
Forma:
Prelúdios – Bach não os submeteu a uma organização aparente, considerando que nessa época, o prelúdio era uma forma livre onde o intérprete podia improvisar. Diversidade, liberdade e imaginação eram a regra. Onze deles foram retirados do Clavierbüchlein.
Fugas – Uma forma por excelência, construída com estrutura própria. Há uma certa unidade entre Prelúdio e Fuga da mesma tonalidade, mais evidente no primeiro volume que no segundo.
Instrumento executante:
Não foi especificado em qual instrumento de teclado deveriam ser executados os Prelúdios e Fugas. Alguns soariam melhor no clavicórdio, outros no cravo, e alguns se adaptariam melhor no órgão. Já houve um questionamento a respeito da execução dessas peças no piano. Atualmente, nada impede que o piano moderno expresse a estrutura do barroco e a idéia de Bach. Segundo Glenn Gould, “estas páginas se distinguem por uma evidente abstração instrumental”.
Andamento:
Há uma certa arbitrariedade quanto à indicação de andamentos nas edições modernas. Bach especificou apenas três: Presto no compasso 23 do Prelúdio nº 10, Andante no Prelúdio nº 24 e Largo em sua Fuga, ambos do primeiro volume, e Largo no Prelúdio nº 16 do segundo volume.

Pequenas Considerações sobre alguns Prelúdios e Fugas
Volume 1:
Nº 1 em Do Maior:
Prelúdio – baseado em acordes quebrados com caráter de improvisação, que era de uso corrente na época de Bach, devido à influência do alaúde.
Fuga – a 4 vozes. Embora as modulações sejam modestas, é mantida uma extraordinária tensão.
Nº 2 em do menor:
Prelúdio – (Clavierbüchlein); como uma toccata ou estudo de virtuosidade para duas mãos, é baseado em um desenho de semicolcheias.
Fuga – a 3 vozes, apresenta uma polifonia transparente, com dois contra-sujeitos e rica em divertimentos.
Nº 3 em Do# Maior:
Prelúdio – como uma invenção a duas vozes.
Fuga – a 3 vozes, possui numerosos divertimentos. Junto com o prelúdio é uma das mais bonitas e mais difíceis deste volume.
Nº 4 em do# menor:
Prelúdio – (Clavierbüchlein); tema calmo e modesto.
Fuga – a 5 vozes, complexa e em estilo de ricercare italiano, soa como peça vocal religiosa. Tríplice, cada sujeito tem sua personalidade própria, sendo o primeiro de caráter severo, o segundo mais instrumental e luminoso e o terceiro cria uma sucessão de divertimentos e episódios variados, se sobrepondo ao primeiro nos compassos que antecedem a conclusão.
Nº 5 em Re Maior:
Prelúdio - (Clavierbüchlein); peça de virtuosidade para mão direita, brilhante, clara e sem pausa, seu ritmo se mantém até o fim.
Fuga – sujeito nobre e majestoso, firmado por um ritmo pontuado à francesa.
Nº 6 em re menor:
Prelúdio - (Clavierbüchlein); peça de virtuosidade para mão direita, utiliza a posição natural da mão sobre o teclado. A cadência está em Re Maior.
Fuga – a três vozes. Bach recomenda que o si do segundo compasso seja executado separado. Utiliza pedal dobrado da tônica no final.
Nº 7 em Mi b Maior:
Prelúdio – curta toccata, introduz episódio em estilo fugato. Prelúdio com orientação de fuga; escrito em duas partes, utiliza fugato a quatro vozes, em estilo antigo.
Fuga – a três vozes, é mais livre, contrastando com o prelúdio. Os divertimentos e marchas nascem dos arpejos do contra-sujeito.
Nº 8 em mi b menor:
Prelúdio - (Clavierbüchlein); seu canto se situa entre um recitativo e um noturno.
Fuga – a três vozes, seu sujeito é um tema de canto gregoriano. Esta peça magnífica anuncia a atmosfera de intenso recolhimento que será a Missa em si menor.
Nº 10 em mi menor:
Prelúdio - (Clavierbüchlein); é um dos raros em que Bach faz indicação de andamento.
Fuga – única a duas vozes.
Nº 11 em Fa Maior:
Prelúdio - (Clavierbüchlein); estudo de virtuosidade para independência de dedos sem passagem do polegar; invenção a duas vozes.
Nº 12 em fa menor:
Prelúdio – como se fosse destinado ao órgão, devido à quantidade de notas ligadas, lembrando que Bach não especificou para qual instrumento de teclado foi escrito.
Fuga – estreitamente ligada ao prelúdio.
Nº 15 em Sol Maior:
Prelúdio – cheio de emoção, escrito a três vozes com sucessivas marchas harmônicas. Apresenta alguma similaridade com o ritmo das Invenções a duas vozes nº 6 e nº 14.
Fuga – calma e serena.

Nº 18 em sol# menor: Bach não utiliza esta tonalidade fora de seus Prelúdios e Fugas.
Prelúdio – movimento dançante caracterizado pelo compasso 6/8.
Fuga – caráter grave, com dois contra-sujeitos, segue o gracioso prelúdio.
Nº 19 em La Maior:
Prelúdio – a três vozes, em estilo de dança leve.
Fuga – caráter esperto, apresenta construção rítmica pouco comum, começando sobre colcheia isolada, utilizando pausa de três colcheias e movimentando em progressão ascendente por quartas.
Nº 20 em la menor:
Prelúdio – caráter de dança graciosa e leve.
Fuga – complexa; o pedal sobre o la (compasso 83) leva à questão: para qual instrumento? Órgão ou cravo com pedal? No cravo ou clavicórdio ela se torna impraticável.
Nº 22 em si b menor:
Prelúdio – construção harmônica densa, predominantemente a quatro e cinco vozes, conclui a nove vozes.
Fuga – a cinco vozes e de estilo sério, assemelha-se à peça vocal.
Nº 23 em Si Maior:
Apresenta grande identidade entre as primeiras notas do Prelúdio e o início da Fuga.
Nº 24 em si menor:
Prelúdio – andamento Andante indicado por Bach. Com caráter de meditação, é mais apropriado para o órgão.
Fuga – Largo também claramente indicado por Bach, apresenta a grandeza e grandiosidade de suas Paixões.

Volume 2: é considerado um prolongamento do primeiro volume, apesar de não apresentar a mesma unidade.
Nº 1 em Do Maior:
Prelúdio – grande improvisação no estilo de prelúdio para órgão.
Fuga – de execução mais fácil que o Prelúdio.
Nº 2 em do menor:
Prelúdio – grandiosa invenção a duas vozes.
Fuga – a quatro vozes, apresenta estranha conclusão em mi menor sobre a 7ª diminuta que precede a cadência final de do menor.
Nº 3 em Do# Maior:
Prelúdio – pequena fuga que se encadeia sobre um acorde de dominante.
Fuga – começa no estilo canônico. Desde o início o sujeito já está exposto invertido. Termina num pedal da tônica
Nº 4 em do# menor:
Prelúdio – peça longa escrita a três vozes com caráter dançante sugerido pelo compasso 9/8.
Fuga – o sujeito teria sido escrito originalmente em do menor. Evoca uma giga italiana e o tema cromático sugere um segundo sujeito.
Nº 5 em Re Maior:
Prelúdio – grande peça a três vozes, escrito como um movimento de sonata, com exposição, desenvolvimento e re-exposição. Utiliza um tema de fanfarra, quase orquestral, lembrando Scarlatti.
Fuga – calma nobre contrastando com a suntuosidade do prelúdio. Utiliza um tema coral no início.
Nº 6 em re menor:
Prelúdio – a superposição das duas mãos do compasso 18 ao 25 torna-se difícil de realizar num só teclado; provavelmente tenha sido escrito para um cravo com dois teclados.
Nº 7 em Mi b Maior:
Prelúdio – como uma giga; orientado sobre um desenvolvimento modulante dos desenhos de arpejos, evoca um alaúde.
Nº 8 em re# menor:
Neste volume Bach abandona o tom de mi b menor, substituindo-o por re# menor, tonalidade pouco usada na época barroca.
Nº 9 em Mi Maior:
Prelúdio – conhecido como um longo movimento de suíte em duas partes, onde o tema inicial é exposto sobre um pedal da tônica.
Fuga – construída sobre um motivo gregoriano de seis notas, o sujeito evoca a polifonia vocal.

Nº 11 em Fa Maior:
Prelúdio – os legatos que se prolongam de uma voz a outra são escritos por Bach. Notam-se efeitos dissonantes particulares, como por exemplo, entre o do bequadro e o do sustenido no compasso 52.
Nº 12 em fa menor:
Prelúdio – escrito em duas seções, se apresenta como um movimento de sonata.
Nº 13 em Fa# Maior:
Prelúdio – inicia como uma overture francesa com valores pontuados e ornamentado com fusas.
Fuga – a condução da peça e a escrita arpejada escolhida por Bach confere um aspecto instrumental à obra.
Nº 14 em fa# menor:
Prelúdio – um dos mais bonitos do segundo livro, pela sua grandiosa serenidade.
Fuga – tríplice (Bach escreve apenas uma em cada volume com esta característica); o primeiro sujeito inicia com intervalos disjuntos, o segundo com ritmo mais enérgico e o terceiro só aparece construído nos compassos que precedem a cadência final.
Nº 16 em sol menor:
Prelúdio – Bach indicou o andamento Largo em seu início; de caráter solene parece um prelúdio para órgão.
Fuga – construída de maneira particular com seis notas repetidas.
Nº 17 em La b Maior:
Prelúdio – o tema principal aparece apoiado num acorde perfeito.
Fuga – o sujeito ligado se opõe a um contra-sujeito cromático, que sugere o começo de um segundo sujeito.
Nº 18 em sol # menor:
Prelúdio – Bach indica as intensidades p e f no compasso 50.
Nº 20 em la menor:
Prelúdio – invenção a duas vozes, escrita em duas partes separadas por uma barra de repetição. A construção inteira se baseia num movimento cromático das duas vozes.
Fuga – a construção é peculiar porque, após a exposição, as novas entradas do sujeito quase nunca são integradas.
Nº 23 em Si Maior:
Prelúdio – conhecido como uma toccata, cortada por dois episódios.
Fuga – soa como uma fuga para órgão.
Nº 24 em si menor:
Prelúdio – o tema é enunciado pela mão direita e pela esquerda. Um brusco corte na sensível leva o tema inicial à mão esquerda.
Fuga – construída sobre um tema de passapied. O contra-sujeito é efêmero; ao desaparecer definitivamente, dá lugar a um novo contra-sujeito muito instrumental, que vai até a coda.

VARIAÇÕES GOLDBERG
BWV 988
Publicadas em 1742, formam a quarta parte do Clavier-Übung, e foram encomendadas pelo Conde von Keyserling para que o cravista Goldberg (aluno de Bach) pudesse tocá-las no quarto ao lado, preenchendo o vazio das noites de insônia sofridas pelo Conde. O título usado por Bach, a princípio, foi Ária com algumas variações para cravo a dois teclados.
Apesar de Bach ter sido muito preciso, mostrando a natureza do instrumento para qual foi escrito, sendo algumas para dois teclados, outras para três e outras apenas um, a questão existe: pode ser executado no piano? Pela estrutura da escrita, com superposição de mãos e rápida repetição de notas, tende-se a optar pelo cravo. No entanto existem excelentes gravações no piano, como é o caso de Glenn Gould.
Escrita em Sol Maior, o esboço harmônico da primeira Ária está presente na maioria das variações, exceto em três que estão no modo menor. À medida que se desenvolve vai tornando-se mais brilhante e mais difícil tecnicamente. Esta primeira Ária é uma Sarabanda muito ornamentada, em estilo francês, que também aparece no Clavierbüchlein, escrito para Anna Magdalena.
1ª variação – estilo de invenção a duas vozes, para um teclado.
2ª variação – a três vozes.
3ª variação – cânone all’unisuono, uma das mais difíceis.
4ª variação – alegre, ritmo rápido, é uma invenção a quatro vozes.
5ª variação – para um ou dois teclados, é um duo rápido e claro antes do segundo cânone.
6ª variação – cânone alla seconda.
7ª variação – tempo de giga, para um ou dois teclados, possui caráter de Siciliana.
8ª variação – para dois teclados, com grande ornamentação do tema.
9ª variação – cânone alla terça.
10ª variação – para um teclado, fughetta construída a quatro vozes.
11ª variação – para dois teclados, o cruzamento de mãos impõe o uso do cravo.
12ª variação – para um teclado, cânone a três vozes, alla quarta.
13ª variação – grande ária ornamentada à italiana sobre uma escrita a três vozes.
14ª variação – brilhante tocata para dois teclados; extremamente rápida, com quatro temas, seu estilo se firma desde os primeiros compassos.
15ª variação – cânone alla quinta; andante, a primeira em sol menor; de caráter expressivo, por isso o andamento moderado.
16ª variação – overture francesa em duas partes, sendo a primeira lenta e majestosa, com ritmo pontuado e a segunda um fugato a três vozes.
17ª variação – para dois teclados, lembra uma toccata, onde apenas uma idéia é desenvolvida.
18ª variação – cânone alla sexta.
19ª variação – ária em trio sobre o ritmo de passapied.
20ª variação – para dois teclados, é uma toccata muito brilhante, com três idéias dominantes.
21ª variação – cânone alla sétima, é a única que Bach não indica para quantos teclados. Utiliza cromatismo descendente.
22ª variação – alla breve, cânone imitativo em três vozes superiores.
23ª variação – toccata para dois teclados.
24ª variação – cânone alla oitava, dança moderada que se desenvolve sobre o balanço rítmico de uma sarabanda.
25ª variação – adagio para dois teclados, em sol menor; é uma ária a três vozes em estilo italiano, muito ornamentada.
26ª variação – chacone para dois teclados, utiliza polirritmia, empregando o compasso 18/16 na mão direita e 3/4 na mão esquerda.
27ª variação – para dois teclados, cânone alla nona, é simples e clara, com imitações de compasso em compasso.
28ª variação – toccata para dois teclados.
29ª variação – toccata para um ou dois teclados, apresenta uma sucessão de acordes brilhantes que se alternam nas duas mãos.
30ª variação – para um teclado, é uma coda livre, com duas melodias populares que se superpõem. Depois de um momento de jovialidade, Bach retorna à primeira versão da Sarabanda inicial.

CLAVIERBÜCHLEIN
Bach escreveu, com esse título, uma obra de cunho didático, constituída de dois livros, sendo o primeiro dedicado a Wilhelm Friedemann e o segundo, em dois volumes, dedicado a Anna Magdalena. Essa obra contém duas tábuas: uma mostrando a maneira de figurar as claves de sol, do e fa, e outra explicando treze sinais de ornamentos. Encontra-se, em seu início, o famoso Applicatio em ut majeur (BWV 994), onde Bach sugere a utilização do terceiro dedo sobre o quarto e inicia o uso do polegar, uma ousadia para a época.
O volume dedicado a Wilhelm Friedemann contém as primeiras versões das Invenções e Sinfonias e alguns Prelúdios do Livro I do Cravo bem Temperado.
No primeiro volume do Clavierbüchlein dedicado a Anna Magdalena, encontra-se a primeira versão das Suítes Francesas e também peças para órgão. O segundo volume é uma coletânea de peças como: minuetos, marchas, poloneses, musette, duas Partitas, duas Suítes Francesas, já transcritas do primeiro álbum, e também cópias de peças de diversos autores como: Hasse, Böhm, Couperin e alguns de seus filhos.

INVENÇÕES A DUAS E TRÊS VOZES
BWV 772 – 786 e BWV 787 – 801
Publicadas em Cöthen em 1723, foram escritas com fins educacionais. Em seu prefácio, Bach afirma que essas obras se destinam àqueles que queiram aprender a executar corretamente peças a duas e depois a três vozes.
As tonalidades seguem em ordem cromática e, por motivos pedagógicos, Bach evita tonalidades mais difíceis. Explora todos os processos conhecidos por ele: fuga, cânon; utiliza formas de escrever que lembram o cromatismo, o uso de pedais harmônicos, o princípio do baixo contínuo ou as diversas maneiras de se ornamentar um tema.
Cada peça é estritamente monotemática, sendo que as Invenções a duas vozes são mais limitadas e menos variadas que as Sinfonias (a três vozes).

SUITES INGLESAS
BWV 806 – 811
Não se conhece a data exata da composição dessas peças. No entanto, a diversidade encontrada nas seis suítes leva a crer que foram compostas em épocas diferentes.
A origem do nome não é explicada por Bach, mas o musicólogo J. N. Forkel acredita que tenham sido dedicadas a um rico inglês. Já Karl Geiringer admite a hipótese de que Bach tenha sido influenciado por peças de Charles Dieupart, compositor francês cuja carreira se desenvolveu em Londres. Sua Giga em La Maior serviu de modelo para o Prelúdio da primeira Suíte Inglesa.
Ao contrário das Suítes Francesas, que possuem características da música francesa, as Suítes Inglesas não apresentam qualquer similaridade com a música inglesa. São mais difíceis que as primeiras e denotam um caráter concertante deliberadamente instrumental.
Cada suíte começa por um prelúdio de grande envergadura, todas com oito partes, sempre em forma binária e estão organizadas em ordem decrescente de tonalidade: La Maior, la menor, sol menor, Fa Maior, mi menor e re menor.

SUITES FRANCESAS
BWV 812 – 817
Bach teria terminado essa coleção de seis suítes durante sua permanência em Cöthen, sendo que as cinco primeiras foram copiadas do Clavierbüchlein dedicado a Anna Magdalena.
A origem do nome tanto pode se referir ao agrupamento de danças em esquema clássico, como à influência da música francesa durante a juventude de Bach. Todas são compostas de seis ou oito partes, de execução relativamente fácil, sendo a Suíte nº 1 de caráter arcaico, e a nº 6 a mais brilhante e mais célebre. Construídas com peças em forma binária com repetição, sendo as três primeiras em modo menor e as três últimas em modo Maior.

PARTITAS
BWV 825 – 830
Foram publicadas por Bach, em Leipzig, entre 1726 e 1731, sendo uma por ano. Em 1731 foram publicadas integralmente como op. 1, recebendo o nome de Clavier-Übung.
Possuem a estrutura de uma suíte, porém são mais ricas e mais complexas. Cada uma começa com uma introdução, com títulos diferentes: Prelúdio, Sinfonia, Fantasia, Overture, Praeambulum e Toccata. Todas contêm as quatro danças tradicionais da suíte (Alemanda, Sarabanda, Corrente e Giga), acrescidas de algumas Galanteries, tais como: Minueto, Passapied, Burlesca, Scherzo e Rondo.
Com as Partitas, Bach renova consideravelmente a característica da suíte, elevando-a a seu mais alto nível.
Partita nº 1: em Si b Maior, com sete partes, distingue-se pela simplicidade relativa e concisão do Prelúdio.
Partita nº 2: é mais vasta e polifônica que a nº 1.
Partita nº 3: com sete movimentos, intercalando Galanteries: Burlesca e Scherzo.
Partita nº 4: em Re Maior, sinônimo de alegria e brilho.
Partita nº 5: intercala duas Galanteries entre a Sarabanda e a Giga: Minueto e Passapied.
Partita nº 6: em mi menor, sua versão primitiva se encontra no Clavierbüchlein, cuja toccata, utilizada como peça de introdução, possui caráter de improvisação e liberdade controlada.

ABERTURA EM ESTILO FRANCÊS EM SI MENOR
BWV 831
Pertence à segunda parte do Clavier-Übung, que contém também o Concerto Italiano. Escrita para cravo com dois teclados, contém onze movimentos, e pode ser considerada uma síntese entre a Suíte para Cravo e a Abertura para Orquestra.
Bach faz indicações de intensidade, utilizando o forte para o tutti e piano para os solos da linha melódica. A Abertura, que é escrita em três partes (grave, allegro fugato e grave), precede danças tradicionais (Corrente, Gavota I e II, Passepied I e II, Sarabanda, Bourrée I e II, Giga, Echo) e toda ela possui espírito francês, que se deve à convivência de Bach com a música de compositores franceses, dentre eles Couperin, muito tocada na corte alemã.

FANTASIA CROMÁTICA E FUGA EM RE MENOR
BWV 903
Publicada em 1802, teria sido iniciada em Cöthen e terminada em Leipzig, em 1730. Durante certa época, existiu uma dúvida a respeito de seu autor: se teria sido mesmo composta por J. S. Bach, Carl Philipp ou ainda Wilhelm Friedemann Bach. Essa obra exerceu grande influência sobre o romantismo.
A Fantasia é extremamente atormentada e movimentada. Possui três partes: a primeira uma Toccata, com espírito de improvisação e caráter virtuosístico, com um tratamento só encontrado na cadência do quinto Concerto de Brandemburgo; a segunda um amplo recitativo arioso, carregado de alterações e com grande força expressiva e a terceira um estilo improvisado do início e elementos do recitativo. As alterações se multiplicam até acalmar na cadência final.
De estilo nórdico, foi escrita à maneira de Buxtehude, caracterizado por utilizar a paixão, a grandeza, a fantasia e a procura de timbres variados. A Fuga, por sua vez, é calma, com harmonia enriquecida por tonalidades distantes de re menor. Termina com o baixo pesado e dobrado, utilizando o acorde de quatro sons, que soa como baixos de órgão. Esta resolução nunca tinha sido utilizada antes por Bach.

CONCERTO ITALIANO
Publicado em 1735, foi escrito para cravo solo com dois teclados. Essa obra-prima revela o Bach organista, sinfonista e o mestre da forma do concerto. Por que esta obra é chamada italiana e por que um concerto? Primeiro, por causa dos três movimentos que compreendem o concerto – Allegro, Andante, Presto – conforme o plano geral do concerto italiano. Segundo, porque este Concerto representa o arranjo para teclado de uma obra orquestral com um solista, baseado em um modelo existente apenas na imaginação do compositor. Nos compassos de abertura do Allegro percebe-se o tutti orquestral em oposição aos motivos lineares da voz solista. Essas passagens solo são tocadas em um teclado enquanto o outro teclado sustenta os acordes, como no estilo italiano. O Andante é lírico e quase dramático com seus recitativos e síncopes, mas também possui um amplo contorno melódico. O estilo concertato aparece novamente no final Presto onde Bach cria uma habilidosa oposição entre tutti e solista. Este final evoca o sentimento jubilante tão característico de Bach.

TOCCATAS
Essas peças são atribuídas à época da formação de Bach, tendo sido compostas em datas diferentes. Não foram editadas enquanto Bach vivia. Não possuem indicação de instrumentação e, apesar de Bach apreciar o clavicórdio, a virtuosidade dessas peças leva a crer que não são apropriadas para esse instrumento. Todas têm uma ou duas fugas.
Nº 1 em fa# menor (1709-1712):
BWV 910 – cinco partes, duas fugas
Nº 2 em do menor (1709-1712):
BWV 911 – três partes, uma fuga
Nº 3 em Re Maior (1705-1708):
BWV 912 – seis partes, uma fuga, um duplo fugato
Nº 4 em re menor (1705-1708):
BWV 913 – primeira a ser publicada, seis partes, duas fugas
Nº 5 em mi menor (1707-1710):
BWV 914 – dois movimentos lentos, duas fugas
Nº 6 em sol menor (1707-1710):
BWV 915 – cinco partes, duas fugas
Nº 7 em Sol Maior (1710):
BWV 916 – três movimentos, sendo dois rápidos (uma fuga) e um movimento central lento



BIBLIOGRAFIA:
GILLESPIE, John. Five centuries of keyboard music. New York : Dover Publications, 1965.
TRANCHEFORT, François-René (dir.) Guide de la musique de piano et clavecin. Paris : Librarie Arthème Fayard, 1987.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Fotos - Compositores Barroco Alemão

Johann Jacob Froberger (1616-1667)

MÚSICA BARROCA ALEMÃ

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS
Disciplina: Literatura e Repertório do Piano
Profª Gyovana Carneiro

MÚSICA BARROCA ALEMÃ

Os conflitos religiosos que aconteceram na Alemanha no séc. XVII e o fato do país estar politicamente descentralizado contribuíram para o nascimento de um clima artístico que criou uma divergência de estilos musicais. Assim como na Inglaterra, as influências francesa e italiana foram muito fortes. Os compositores alemães, no entanto, mais que os compositores ingleses, acrescentaram traços de sua própria iniciativa e imaginação. O estilo resultante foi um terreno fértil, sobre o qual culminou a música barroca para teclado - as composições de J. S. Bach.
A influência italiana foi mais sentida pelos compositores que trabalharam na Áustria e no sul da Alemanha. Houve um uso contínuo de muitas formas originadas na Itália, exemplificadas pela toccata, o ricercare e a canzone. A música italiana influenciou principalmente através das composições de Merulo e Frescobaldi.
A influência francesa foi sentida não apenas pelo grupo de compositores da Áustria e sul da Alemanha, mas também por um grupo centrado em Nuremberg, Stuttgart, Halle e cidades menores da Alemanha Central. Veio da França o conceito da suite de danças como uma forma unificada e o caráter de cada um de seus movimentos. Outros elementos estilísticos de Lully e de outros cravistas podem ser observados, como o uso ocasional de ornamentos floridos, o uso de conceitos programáticos e uma propensão à clareza e refinamento.
Uma terceira e importante influência deve ser mencionada. Veio do norte da Europa, mais especificamente de Sweelinck e seus alunos, particularmente Samuel Scheidt. Essa influência combinava a vivacidade e exatidão da escola italiana com a inventividade e variedade dos virginalistas ingleses. Essas características emergiram na Alemanha no séc. XVII, como as técnicas e estilos expressivos empregados na variação coral, na toccata e na fuga.
Embora muitas músicas desse período sejam obviamente destinadas ao órgão, há um grande número delas que é indicada para qualquer instrumento de teclado, assim como aconteceu em outros países. Na Alemanha o termo clavier era usado para designar a música para qualquer instrumento de teclado.
A emergência de formas do barroco alemão apresenta um quadro complexo. Freqüentemente, vários nomes eram utilizados para designar composições que são basicamente do mesmo tipo. Além disso, vários nomes que eram associados a um tipo de composição começaram a se referir a músicas com diferentes características. Novas designações começaram a aparecer, como no caso das sonatas, e velhos tipos, levemente alterados, receberam novos nomes, como a fuga, por exemplo.
A toccata continuou a ser uma peça de 3 a 5 seções, tendo sido herdadas de Merulo e Frescobaldi. No norte da Alemanha, compositores como Buxtehude começaram a desenvolver um conceito mais amplo da toccata, usando seções mais longas, figurações imaginativas, mudanças harmônicas e certos procedimentos calculados para produzir efeitos dramáticos. A fantasia não é mais uma peça de caráter estritamente imitativo, se tornando quase indistinguível da toccata. O prelúdio e a fuga estavam relacionados ao conceito que guiava as seções alternadas da toccata, onde uma composição altamente imitativa era precedida por uma de relativa liberdade.
Os diversos tipos de variações existentes continuaram a ter importante papel. Podem ser encontradas variações sobre uma melodia simples, uma ária popular, ou sobre uma das melodias padronizadas como romanesca, ruggiero ou passamezzo moderne. Tais variações freqüentemente eram chamadas de partita. Outro tipo de variação era construído sobre um modelo de baixo recorrente e designado por um dos nomes: chaconne, passacaglia ou ground bass. Variações corais eram típicas da música para órgão, mas também eram encontradas ocasionalmente na literatura para cravo e clavicórdio, a maioria entre aquelas peças para teclado que não podem ser restritas a um único instrumento de teclado, como as variações corais que aparecem na Tablatura nova de Scheidt.
O conceito da suite de danças foi emprestado da França, mas a estabilização de seu formato se deu na Alemanha. A seqüência que hoje é associada a suite barroca é exemplificada mais claramente nas obras de J. S. Bach, como se segue:
(A) allemande
(C) courante
(S) sarabande
(O) opcional: minuet, bourrée, gavotte, polonaise, passapied, aire, etc.
(G) gigue

Antes de Bach, a organização dos movimentos era variada. Por exemplo, Johann Erasmus Kindermann usou apenas ACS, e Matthias Weckmann AGCS. Johann Jacob Froberger foi a figura mais importante antes de Bach, no desenvolvimento da suite de danças na Alemanha.
A sonata teve seu ponto de partida na Itália com a sonata di chiesa. O primeiro uso do termo sonata é atribuído a Adriano Banchieri (1567-1634) como um título de exemplos musicais, encontrado em um tratado que escreveu sobre a execução do órgão, L'organo suonarino (1605). O primeiro compositor alemão a usar o termo, como um movimento de uma suíte, foi Johann Heinrich Schmelzer (ca. 1623-1680). Johann Kuhnau (1660-1722) chamou 14 de suas peças de sonatas, adicionando a suas últimas peças com esse título projetos mais elaborados e elementos descritivos. As primeiras sonatas contêm de três a seis movimentos contrastantes, freqüentemente organizados em uma seqüência que alternava andamentos lentos e rápidos. O estilo tanto podia ser de uma canção como o de uma melodia contrapontística, com o baixo funcionando como um contínuo para duas partes superiores.

Compositores:
Samuel Scheidt (1587-1654): um elo importante entre o estilo inglês do norte da Europa e a Alemanha, estudou com Sweelinck em Amsterdã. Sua obra mais importante é a coleção Tablatura nova, escrita para instrumentos de teclado em geral e que contém corais, toccatas, fantasias, passamezzos, salmos, hinos, Magnificats e uma missa. As peças estão escritas na textura homofônica e polifônica.
Johann Jacob Froberger (1616-1667): figura importante no desenvolvimento da suite de danças. Possui um estilo pessoal e sensível. Não indica ornamentação, deixando a cargo do intérprete. Suas obras incluem: 25 toccatas, 8 fantasias, 6 canções, 18 caprichos, 15 ricercares e 30 suites. A ordem original dos movimentos da suite era ACGS ou AGCS, mas o editor colocou-as numa "melhor ordem" depois da morte do compositor, estabelecendo a seqüência que hoje é associada à suite: ACSG.
Johann Casper Kerll (1627-1693): sua obra mais importante é para órgão: Modulatio organica super Magnificat octo tonis. Outras obras para teclado incluem canções, caprichos e toccatas. Utilizava procedimentos descritivos em suas obras.
Dieterich Buxtehude (1637-1707): influenciou Bach e Handel. Embora a maior parte de sua obra para teclado tenha sido dedicada ao órgão, um pequeno número de peças para cravo foi descoberto em 1942 e consiste de 19 suites (ACSG), 6 variações e 3 outras peças menores de autenticidade questionável. Exibem um estilo simples com considerável vivacidade e imaginação.
Johann Kaspar Ferdinand Fischer (ca 1650-1746): mostra grande influência francesa. Algumas de suas primeiras suites apresentam um prelúdio como peça introdutória. A ordem dos movimentos varia e quase nunca é ACSOG. São peças curtas, mas mostram habilidade e imaginação.
Johann Krieger (1652-1735): suas principais obras são: Musicalische Partien, uma série de seis suites na ordem ACSG e Anmutige Clavier-Übung, uma das primeiras obras a unir um prelúdio a uma fuga na mesma tonalidade.
Georg Muffat (1653-1704): sua principal obra para teclado é Apparatus musico-organisticus, escrita para órgão. Mostra influência de Corelli e Lully.
Johann Kuhnau (1660-1722): foi uma das figuras mais proeminentes no desenvolvimento das primeiras sonatas para teclado. Sua primeira sonata, em si b, está escrita em quatro pequenas seções e alterna andamentos lento-rápido-lento-rápido. Sua coletânea mais célebre de sonatas é Musicalische Vorstellung einiger biblischer Historien in 6 Sonaten, onde cada sonata é baseada em uma narrativa bíblica.
Georg Böhm (1661-1733): sua influência sobre Bach é evidente, visto que seus minuetos aparecem no livro de Anna Madalena. Suas obras para cravo consistem, em sua maioria, de suites.
Johann Pachelbell (1653-1706): suas obras para órgão são importantes por serem consideradas como prenúncio das obras de Bach. Escreveu corais, suites e fugas que provavelmente eram destinadas ao órgão e escritos para ritos religiosos. Embora as fugas sejam curtas e monotemáticas, são consideradas um dos mais importantes exemplos de fugas escritas antes de Bach.
Georg Philipp Telemann (1681-1767): um dos mais prolíficos compositores de toda a história da música, cuja obra infelizmente ainda é ignorada. Pesquisou idéias na França com esperança de reformar a música na Alemanha. Inspirou-se em Couperin, Lully e Rameau. Seu repertório merece ser conhecido, principalmente as sonatas e fugas, que mesclam o estilo galante francês com o vigor italiano, as peças imitativas, as fantasias e as sonatas inspiradas em Pasquini. Seu talento é melhor representado em suas fantasias.

Fotos - Compositores Barroco Francês

Jean-Philippe Rameau (1683-1764):

Louis Couperin (1626-1661

Música Barroca Francesa

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS
Disciplina: Literatura e Repertório do Piano
Profª Gyovana Carneiro


MÚSICA BARROCA FRANCESA

Na França, o mais popular instrumento da Renascença e do princípio do período Barroco foi o alaúde. Como os outros instrumentos barrocos, os alaúdes eram obras de arte altamente elaboradas. Os intérpretes do alaúde desenvolveram um estilo distinto de execução, que foi famoso por toda a Europa. Ornamentavam suas músicas adicionando notas, deslizando o dedo pela corda, depois que esta foi acionada, movimentando o dedo de um lado para outro, e de muitas outras maneiras sutis. Como a popularidade do alaúde começou a diminuir, o cravo se tornou mais e mais moderno. Era um instrumento adequado para ambientes pequenos e, como era um favorito da corte, era também um símbolo de status.
Os cravistas adotaram muito dos efeitos estilísticos dos alaudistas. Os acordes quebrados, cujos sons se sobrepunham e ressoavam juntos antes de diminuírem, no alaúde, foram transferidos imediatamente para o cravo. Os ornamentos feitos com o deslizamento do dedo se transformaram em apogeaturas prolongadas, associadas a peças delicadas. A elegância, ritmos desiguais, tão característicos da linguagem francesa e da poesia em particular, tornou-se um aspecto tão dominante da música francesa, que a fez reconhecível ao ouvido, mesmo que o compositor fosse desconhecido.
As decorações arquitetônicas elaboradas, os costumes suntuosos e excessivos, as maneiras ritualísticas da corte, tudo isto é encontrado na música, sob a forma de ornamentos delicados e quase sempre excessivamente abundantes. Os franceses eram mais aptos a escrever a ornamentação específica que os italianos, mas a desigualdade característica do ritmo francês, bem como a excessiva pontuação em peças vivas e enérgicas, era tomada por certa mesmo sem notação específica. Em seu livro, A Arte de tocar o Cravo, François Couperin escreveu que o intérprete devia aparentar naturalidade diante do instrumento, como se raramente se preocupasse com a técnica do que estava executando. Isto chama atenção para o fato de que, ainda que um grande cuidado devesse ser exercitado nesta música, ela deveria sempre aparentar como improvisadamente elegante.


A DESIGUALDADE
Os músicos que tocam música “popular”, incluindo jazz, blues, rock, entre outros, têm muitos costumes em comum com os músicos da era barroca. Eles improvisam, alteram ritmos e melodias livremente. Um costume importante é a prática de tocar desigualmente (longa-curta, longa-curta) notas que são escritas igualmente (duas colcheias, por exemplo). Este é o artifício que, originalmente deu ao jazz seu som dançante e relaxado, e aplicado a todos os tipos de música popular.
A quantidade exata de desigualdade depende do caráter ou estilo da peça, tanto quanto do andamento e capricho do intérprete. Esta é exatamente o tipo de coisa que não pode ser precisamente indicada na notação escrita.
As instruções escritas pelos músicos mais antigos provam que esta prática vem desde o final da Renascença. Embora não tenha nenhuma evidência de que tenha começado na França, a desigualdade se tornou, durante o período barroco, uma parte importante do estilo francês de performance. Em seu livro A Arte de tocar o Cravo, François Couperin escreveu: “Não tocamos nossa música como está escrita, mas pontuando as várias colcheias que se sucedem por graus conjuntos; contudo, as escrevemos em valores iguais”.
A desigualdade é algumas vezes, indicada na música barroca francesa por um sinal de ligadura sobre pares de notas que se movem numa escala. É dado como certo que outras notas numa escala, se estas são mais rápidas que a unidade de tempo, e se descem naturalmente por pares, devem ser tocadas desigualmente, mesmo se não estiver indicada na partitura. A desigualdade acrescenta grande elegância a muitas melodias de andamento moderado. No entanto, não é utilizada em andamentos muito rápidos, onde soaria furioso, frenético, nem em andamentos muito lentos, que soaria moroso, preguiçoso. Não é usada em peças onde há muitas figuras quebradas, saltos e notas repetidas, ou em passagens que contém grupos mistos de notas e pausas.
A quantidade de desigualdade a ser utilizada deve se estender de uma sutil, quase imperceptível diferença entre longo e curto, até um enérgico ritmo pontuado de colcheia e semicolcheia.

Compositores:
Louis Couperin (1626-1661): tio de François Couperin, sucedeu seu pai como organista em St. Gervais, em Paris. Ele e seus dois irmãos estudaram com o celebrado Chambonnières. Um de seus contemporâneos escreveu que sua execução ao cravo era “altamente considerada por pessoas instruídas, por causa dos acordes simples que ele enriquecia com bonitas dissonâncias, desenhos e imitações”.
Jacques Champion de Chambonnières (1602-1673): foi reconhecido pela “clareza e suavidade de seu toque ao cravo”. Foi um compositor e professor famoso e sua influência foi amplamente sentida. É conhecido como o fundador da escola francesa de compositores para cravo. Entre seus alunos destaca-se Louis Couperin.
Jean-Philippe Rameau (1683-1764): foi famoso não só por suas obras para cravo, mas também como um compositor de ópera e música de câmara. Seus tratados teóricos sobre harmonia ajudaram a estabelecer o uso dos acordes maiores e menores de hoje.
Michel Corrette (1709-1795): foi organista e compositor do Colégio Jesuíta de Paris, em 1738. Compôs música para igreja, de câmara e para cravo solo, e também métodos para voz e vários instrumentos.
François Dieupart (1670-1740): foi um famoso cravista e violinista francês. Mudou-se para Londres em 1700 e foi, durante muitos anos “maestro al cembalo” (condutor-cravista) nas óperas de Handel.
François Couperin (1668-1733): parece ter vivido toda a sua vida em Paris. Era sobrinho de Louis Couperin, e foi o mais famoso de uma linhagem de músicos chamados Couperin. Seus contemporâneos o apelidaram de “O Grande”. Foi organista e cravista do “Rei Sol”, Luis XIV. Além de música de câmara e de igreja, escreveu quatro livros de peças para cravo e um importante livro sobre técnica e estilo, intitulado “A Arte de tocar o Cravo”, que é um dos mais importantes livros escritos por um grande músico da era barroca.